Seção 2

Dados que gritam a realidade

As necessárias contribuições das mulheres rurais

“Tenho trabalhado muito no campo, é assim que conheço as mulheres reais que estão lutando por coisas reais, as quais, de verdade, afetam todo o mundo”
Vandana Shiva

Compartilhar o conhecimento e a experiência é o maior banquete ao qual possa ser convidada e, por essa razão, quero começar agradecendo ao Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) por me oferecer essa oportunidade. Minha experiência é dupla. De um lado, como acadêmica onde tenho dirigido projetos de pesquisa sobre as mulheres rurais e, por outro, como membro que fui do Comitê Antidiscriminação da Mulher (CEDAW), um organismo perante ao qual foram examinados os Estados para expor suas políticas públicas em termos de igualdade.

Um dos artigos sobre os quais interrogamos os Estados era relacionado à mulher rural (artigo 14 da Convenção) com o que tínhamos acesso ao conhecimento das diversas dificuldades nos diversos âmbitos territoriais e, certamente, à resposta política de cada país. A CEDAW dispõe de uma Recomendação Geral (número 34/2016) sobre os Direitos das Mulheres Rurais, que seria útil para divulgar nos diversos parlamentos, porque inclui educação, emprego, acesso a recursos, como a justiça, a sanidade e, obviamente, as políticas públicas destinadas a favorecer que as mulheres do âmbito rural participem da tomada de decisões.

Tive oportunidade de trabalhar por um duplo prisma: primeiro, nos quatro anos no Comitê, onde todos os Estados, sem exceção, deviam responder com dados concretos a esse tema, e, em segundo lugar, pelo meu cargo político como Secretária Geral de Políticas de Igualdade de 2004 a 2008, onde a elaboração da Lei de Igualdade Efetiva entre Mulheres e Homens (Lei Orgânica 3/2007) nos proporcionou informações sobre quais são os desafios pendentes que não estão condicionados a um forte investimento orçamentário, senão por uma decidida vontade política para neutralizar a discriminação das mulheres no meio rural.

1. Não são proprietárias, mas trabalhadoras informais. Uma característica comum das mulheres rurais é que elas compartilham os trabalhos de uma exploração agrícola e de criação de gado pelo matrimônio. Ou seja, são os maridos que pagam a seguridade social, quando há, ou são os maridos os que vão às feiras de gado, fixam os preços e as transações comerciais. Caberia perguntar: Quantas mulheres estão presentes em organizações de agricultores? A maioria das mulheres rurais passa a depender do salário de seu esposo, estando, portanto, imersas na economia informal que procura uma relação matrimonial, onde todos os bens e propriedades estão em nome do cônjuge masculino. Por esse motivo, na Espanha, optou-se por corrigir essa situação e, ao elaborar a Lei de Igualdade, foi incluído um artigo que regulava sua participação em termos de titularidade compartilhada, o que solucionou a onerosa dependência do homem, evitando, dessa maneira, que em caso de divórcio elas ficassem absolutamente desprotegidas. 2. A falta de acesso a recursos. A educação é a primeira condição que permite conhecer os demais direitos, posto que, sem formação, é impossível conhecer que garantias e direitos oferecem as diversas legislações de cada país. A formação profissional nessa matéria ficou reservada aos homens, por entender que era uma economia intensiva de grandes jornadas de trabalho sem períodos de descanso de verão. Não há incentivos para que as mulheres jovens desenvolvam ideias inovadoras em seus locais de origem. Os fluxos da população rural para as cidades ocorrem pela carência de serviços. E se tem demonstrado que o enraizamento populacional depende diretamente das mulheres, ou seja, dos serviços de saúde e educação, além de um transporte que permita ter acesso a serviços mais exigentes, como complexos hospitalares, ou atenção aos serviços sociais da zona.

3. A falsa ideia de que as mulheres são um coletivo. Ao elaborar políticas públicas, ou seja, abordar a governança definida como a ação de um governo onde suas medidas estejam validadas pela participação do cidadão, é comum cometer o mesmo erro: considerar que as mulheres são um coletivo com dificuldades especiais. Não somos um coletivo. Segundo os dados demográficos, nós, mulheres somos a maioria da população em todos os países do mundo, com variações naqueles que sofreram um sério conflito ou têm sua população deslocada. Os governos devem entender que não coletar as contribuições das mulheres rurais, em termos de ideias para melhorar sua própria exploração, representa continuar trabalhando com os prejuízos – não com os dados estatísticos – que, como coletivo, estão mais interessados em seus problemas do que em suas contribuições. Os governos utilizam a oportunidade de facilitar denominações de origem dos produtos agrícolas? Ou seja, recuperam artes e ofícios artesanais que o novo paradigma da sustentabilidade reclama como um novo nicho de mercado? E quem são as que se dedicam com maior resultado a essas inovadoras formas de produção: as mulheres rurais. O que poderia se traduzir em ramos profissionais específicos de uma agricultura ecológica. 4. A participação na vida política. Se os governos não abordarem planos de igualdade para as mulheres rurais, é evidente que elas não terão uma participação possível no projeto das estratégias políticas. Mas a vida política se baseia em uma estrutura de lealdades, de apoios, onde o intercâmbio de favores deixa fora de jogo as trabalhadoras do âmbito rural, posto que a divisão territorial, prefeitos, governadores, dirigentes, constituem uma elite formada, de maneira praticamente exclusiva, por homens.

5. A falta de coletivização dos avanços. O melhor procedimento para poder se transformar em interlocutoras das diversas autoridades públicas é passar do individual para o coletivo, porque a própria natureza da atividade agrícola é propensa a se desenvolver em pequenas ou grandes propriedades de terras, mas, em todo caso, sem uma interconexão entre elas, exceto se um produto ou serviço é compartilhado para vender no mercado. As mulheres rurais devem se unir não só em torno do produto final, mas das condições de vida que compartilham para alcançar uma maior qualidade de vida. É urgente se associar, no caso das mulheres rurais.



Entretanto, o mais urgente é que os poderes públicos incluam em sua agenda política o meio rural, cada vez mais exposto a um mercado globalizado, onde os direitos humanos correm o risco de se converter em um capítulo de despesa e não no indicador democrático de um governo.

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Soledad Murillo de la Vega • Las necesarias aportaciones de las mujeres rurales Soledad Murillo de la Vega

Secretaria de Estado de Igualdade Ministério da Presidência, Relações com as Cortes e Igualdade da Espanha