Seção 1

Mulheres rurais na agenda...
A agenda das mulheres rurais

O apoio às mulheres rurais é questão de justiça e de direitos fundamentais

A sustentabilidade do meio rural implica enfrentar as desigualdades que as mulheres ainda sofrem ali

As mulheres que vivem no meio rural desempenham um papel essencial na economia rural e são agentes-chave para garantir a vida das zonas rurais, facilitar a renovação das gerações, evitar o despovoamento e alcançar um desenvolvimento social economicamente e ambientalmente sustentável, tanto do meio rural como de toda a sociedade.

Na Espanha, dos mais de 8.000 municípios existentes quase 72% têm população menor que 2.000 habitantes. A metade das pessoas que reside no meio rural são mulheres. Mulheres que trabalham todos os dias em suas atividades agrárias; mulheres empreendedoras, empresárias autônomas que apostam na implementação de iniciativas empresariais inovadoras, que oferecem produtos ou serviços de que seu entorno carece e que são agentes poderosas de mudança para uma agricultura mais sustentável e ecológica.

As mulheres do meio rural, em particular as mais jovens – que têm na Espanha um nível de formação superior ao dos homens jovens – entenderam perfeitamente as possibilidades que se abrem com a diversificação da economia em seus territórios, por meio de atividades que complementam as da agricultura e de criação de gado, como é o caso, entre outros, do turismo rural, do ecoturismo, do agroturismo, do turismo de experiência, do artesanato e dos ofícios artesanais, bem como da transformação de produtos autóctones e do setor da agroalimentação.

No entanto, essas mulheres enfrentam obstáculos que reduzem assuas oportunidades de acesso a um emprego de qualidade e as submetem a jornadas de trabalho intermináveis, para além daquela remunerada – muitas vezes, mais mal remunerada que a dos homens –,incluindo a responsabilidade quase exclusiva dos cuidados de filhos e filhas, idosos e pessoas em situação de dependência. Tudo isso dificulta e reduz as suas oportunidades de acesso ao emprego, à participação social e política, aos lugares onde se tomam as decisões – em resumo, à igualdade real e efetiva de oportunidades.

Trata-se de barreiras estruturais, de estereótipos arraigados que perpetuam papéis tradicionais de gênero que tornam as mulheres responsáveis pelas tarefas invisíveis e não remuneradas; e da masculinização enraizada da atividade agrária e pesqueira, que dificulta a participação das mulheres e sua presença nos postos decisórios e impede seu acesso à propriedade das terras e aos serviços e infraestruturas.

A eliminação dessas barreiras e o apoio às mulheres que vivem nesse entorno são uma questão de justiça e direitos fundamentais, pois sem as mulheres a vida nos povoados se esvai, envelhece e acaba por desaparecer.

A avaliação e o reconhecimento pleno do seu trabalho – remunerado e não remunerado – o seu empoderamento e a facilitação de acesso aos serviços de cuidados disponíveis e de qualidade são uma tarefa indispensável para o cumprimento dos compromissos assumidos na Agenda 2030, em concreto no tocante ao Objetivo 5, “Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas”. Esse Objetivo está intimamente relacionado com o Objetivo 1, “Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares”; com o Objetivo 2, “Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição”; o Objetivo 8, “Promover o emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todas e todos”; e o Objetivo 13, “Tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos”.

Na Espanha, modificamos o nosso ordenamento jurídico e incorporamos novas normas para cimentar uma sociedade mais justa. A aprovação da Lei 3/2007, de 22 de março, estabelece a efetiva igualdade de mulheres e homens ao introduzir o princípio de igualdade de tratamento e de oportunidades entre mulheres e homens no conjunto das políticas. Essa lei dispensa atenção especial à situação das mulheres que vivem no meio rural, e, além das ações voltadas para a melhoria do nível educativo e de formação, leva em conta também as que favorecem sua incorporação ao mercado de trabalho e aos órgãos de direção de empresas e associações.

De importância especial é a modificação jurídica trazida pela Lei 35/2011, de 4 de outubro, referente à titularidade compartilhada das atividades agrárias, tão demandada pelas associações e entidades de mulheres do meio rural. Com essa lei se deu um passo adiante na modificação das estruturas agrárias, ao se reconhecer a equiparação de direitos das mulheres no setor agrário, o valor do seu trabalho e a proteção da seguridade social. Ela possibilita a administração, representação e responsabilidade na atividade compartilhada entre as suas duas partes, a divisão das receitas em 50%, a consideração dos dois titulares como beneficiários diretos das ajudas e dos subsídios de que seja objeto a atividade e um modo singular e específico de cálculo na seguridade social. Mas, embora tenha representado avanços importantes, essa lei não acabou com todos os problemas que pretendia combater. Por isso, seu aperfeiçoamento contínuo continua sendo necessário.

Além disso, é indispensável aproximar as novas tecnologias da informação e da comunicação aos núcleos rurais, na medida em que constituem uma ferramenta fundamental para o desenvolvimento de mulheres e meninas. Garantir o seu acesso às TIC, promover a sua participação na sociedade da informação, aumentar a sua confiança e segurança no uso das novas tecnologias, promover as aptidões e proporcionar as informações e os conhecimentos necessários podem contribuir, juntamente com a ampliação da banda larga para todos os núcleos da zona rural, para a incorporação das mulheres ao ambiente trabalhista.

Seguinte essas diretrizes, estamos trabalhando, mediante programas que facilitam a formação, o assessoramento, a mentorização e o coaching das mulheres rurais que desejam autoempregar-se ou implementar projetos de negócio. Dispomos de uma plataforma de comércio eletrônico (http://desafiomulherrural.es/ecommerce/) que dota as empreendedoras do meio rural de um canal telemático pelo qual podem divulgar e vender seus produtos nos mercados local, nacional e internacional, de forma acessível. Essa plataforma de comércio eletrônico é acompanhada por um serviço de tutorização personalizada para facilitar sua utilização pelas empreendedoras, a divulgação de seus produtos e transações econômicas seguras.

Trabalhamos com o setor agroalimentar, em particular nas cooperativas em que gira a economia da maioria dos povoados das zonas rurais da Espanha, promovendo uma mudança cultural de mulheres e homens que permita às mulheres alcançarem postos de alta responsabilidade, inclusive nos conselhos diretores em que atualmente a sua presença é extremamente baixa.

Outra parte essencial é o apoio ao associacionismo das mulheres rurais, instrumento poderoso de participação que lhes permite ocupar espaços públicos, distribuir estratégias de ação coletiva, facilitar a participação ativa na vida social e trabalhista e desenvolver os seus direitos de cidadania.

Além disso, é necessário ter presente a situação especial de vulnerabilidade em que se encontram as mulheres rurais diante da violência de gênero. Na Espanha, o Pacto de Estado contra a Violência de Gênero, aprovado sem nenhum voto contrário por todos os grupos parlamentares, contempla medidas específicas para o combate à violência de gênero nesse coletivo. Essas medidas abrangem, entre outras, áreas como a prevenção e a conscientização; a resposta institucional, a coordenação e o trabalho em rede; a assistência, a ajuda e a proteção às vítimas; o saneamento básico; e a melhoria do conhecimento.

Definitivamente, a sustentabilidade do meio rural implica enfrentar de forma decidida as desigualdades que as mulheres que nele vivem ainda sofrem, melhorar a sua situação e as suas oportunidades trabalhistas e aumentar a sua presença e participação ativa nos diversos órgãos de direção de empresas, câmaras agrárias e de comércio, entidades sindicais e organizações profissionais e instituições de participação política e social.

Devemos romper as barreiras que nos dias de hoje ainda impedem as mulheres rurais de participar da nossa sociedade em igualdade de condições com os homens, e multiplicar os esforços para superar os obstáculos que dificultam a plena igualdade de oportunidades no mundo rural.


1 Zona rural, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), é o conjunto de municípios com 2.000 ou menos habitantes de fato.

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Carmen Calvo • Apoyar a las mujeres rurales es cuestión de justicia y de derechos fundamentales Carmen Calvo

Vice-Presidenta do Governo da Espanha